Vinho tinto

Aprendendo sobre o vinho

Dizem que tudo na vida acontece na hora certa. Quando crianças absorvemos informações com enorme velocidade, exatamente na mesma proporção em que não damos importância para isso. Quando jovens, começamos a perceber o peso que as informações que fomos absorvendo terão em nossa vida pessoal e profissional. Mas parece que somente quando adultos – no momento em que a velocidade do aprendizado começa a diminuir – é que vamos descobrir o prazer de aprender.

Felizmente, no mundo dos vinhos (e das bebidas em geral) esse processo é totalmente benéfico, uma vez que somente quando adultos conhecemos nosso limites e sabemos que as bebidas alcoólicas nada mais devem ser do que prazer e conhecimento, coisa que os humores da juventude muitas vezes desconsideram.
Então, para todos aqueles que foram pegos pelo desejo de mais conhecimento sobre vinhos, resta saber onde encontrar as informações necessárias para saciar essa sede. E isso vai depender do tipo de conhecimento que se procura.

Quem é quem
Antes de mais nada é importante explicar que os apreciadores de vinhos e estudiosos do assunto são os “enófilos”. Aqueles que fazem os vinhos são os “enólogos”. E, por fim, aqueles que conhecem e cuidam do serviço dos vinhos nos bares, restaurantes e nas lojas são os “sommeliers”.

Essa divisão é importante no momento de buscar conhecimento, pois as escolas sérias são direcionadas para essas três vertentes, embora em um ponto elas todas convirjam: quem aprecia, faz e serve vinhos tem que ter “horas de taça” (assim como os pilotos precisam de horas de vôo para conseguir seus brevês) e muito estudo teórico.

Abaixo listamos os diversos caminhos, seja para quem quer apenas saber um pouco mais sobre vinhos e fazer bonito na frente dos amigos; seja para quem quer ser o mais profundo dos conhecedores, ou um verdadeiro Master of Wine.

 

São diversos os cursos para iniciantes. O importante, no começo, é aprender e se divertir com o vinho

Para quem quer saber mais
Para os enófilos iniciantes, o leque de opções é grande, variando desde os cursos de iniciação ao mundo do vinho que estão hoje por toda a parte até as degustações dirigidas por grandes conhecedores, produtores e sommeliers. A SBAV (Sociedade Brasileira de Amigos do Vinho), por exemplo, que foi criada em 1980, promove cursos desde básicos até avançados e ainda muitos eventos relacionados ao vinho, como viagens a regiões vinícolas e diversas interações entre a bebida, a comida e a cultura. A ABS (Associação Brasileira de Sommeliers) também oferece cursos recreacionais.

Os que estão começando devem ter em mente que será necessário algum tempo de estudo a seco para entender um pouco da história, geografia, evolução e preparo da bebida – só o suficiente para dar uma base sobre aquilo que vai ser degustado. Depois de um curso básico é importante buscar as degustações dirigidas e até mesmo formar um grupo próprio de estudo – uma confraria, por exemplo -, que, além de ser uma reunião muito agradável, possibilita a troca de impressões e o compartilhamento de garrafas de valores e procedências diversas, sem que isso pese demais no bolso.

Outra opção para essas degustações (em que é possível encontrar apreciadores de todos os níveis) são as lojas, restaurantes e importadoras que as promovem para seus clientes. O objetivo é vender mais, no entanto esses encontros possibilitam o conhecimento dos rótulos diferenciados e, muitas vezes, uma benéfica aproximação com os produtores. É uma prática na qual os dois lados se beneficiam.

Para quem quer trabalhar
Já os que escolheram se dedicar ao serviço do vinho são os sommeliers, e embora muitos dos que ostentam esse título nunca trabalharam em um restaurante, essa formação foi a primeira (embora a profissão não seja reconhecida legalmente) a possibilitar a continuidade de estudo para os interessados no mundo do vinho aqui no Brasil.
Inicialmente, as salas eram cheias de garçons, maitrês e gerentes de alimentos e bebidas e somente alguns curiosos e vendedores. Hoje, a proporção é quase a mesma entre garçons, comerciantes e enófilos, fazendo com que os cursos se dividam em serviço do vinho e negócios, para que os dois grupos tenham suas necessidades de conhecimento bem atendidas.

 

Norio Ito

Para os que querem trabalhar com vinho, seja como sommeliers ou como enólogos, há várias opções de cursos no Brasil, mas também no exterior

No entanto, como o Brasil observa a tradição francesa de serviço, o sommelier continua sendo o encarregado do serviço do vinho, da compra, estoque, controle de garrafas e de harmonização com pratos nos restaurantes e bares. Os cursos de formação costumam durar meses a apresentar certo grau de desafio para muitas pessoas e são oferecidos por instituições importantes, como o SENAC, a Universidade de Caxias do Sul (que tem parceria com uma instituição italiana, a Fisar), algumas regionais da SBAV, escolas de hotelaria (a Fisul em Garibaldi, por exemplo, tem um curso de Enoturismo em que uma das disciplinas é a de Sommelier) e a ABS.

Normalmente é preciso ter ao menos o curso médio completo para cursá-las e algumas preferem receber alunos que já estejam na prática do serviço do vinho. Também existe na Europa um curso que possibilita a obtenção do título de Master Sommelier, oferecido na Inglaterra pela Court of Master Sommelier, que é o título mais alto para quem trabalha no serviço de vinhos.

Para quem quer aprender a fazer
Já aqueles que sentem uma necessidade mais visceral de realmente estar no mundo do vinho, os cursos de enologia (e alguns de agronomia) são a escolha certa. No entanto, deve-se considerar que são cursos de graduação superior, que envolvem tempo e dedicação. No Rio Grande do Sul ainda é possível fazer o curso técnico de enologia, que dura menos, mas ainda assim exige comprometimento longo e presencial. A recompensa é que os enólogos brasileiros são respeitados e têm muito campo de trabalho no Brasil e até mesmo no exterior.

É possível estudar enologia no Rio Grande do Sul e em Petrolina. E se dinheiro não for o problema, algumas escolas superiores na Argentina e no Chile também aceitam brasileiros. Mas quem, apesar de não ter feito tantos cursos, quiser ter uma boa ideia de como é produzir um vinho, pode participar do programa Winemakers da Miolo, por exemplo.

 

Norio Ito
Acima : Dirceu Vianna Jr. é o único Master of Wine brasileiro. Conquistar esse título, que menos de 300 pessoas no mundo possuem, requer anos e anos de dedicação quase que exclusiva ao vinho

MW – O Máximo do Máximo
Contudo, se seu objetivo for ainda mais alto, é possível cursar pós-graduação em assuntos relacionados com a enologia aqui mesmo no Brasil, seja na área de negócios (como o novo curso do SENAC de São Paulo, que aborda a gestão de negócios do vinho, cujo único equivalente está em Bordeaux), nas áreas técnicas de produção (nas universidades gaúchas) e também através dos cursos da Wine School, que são o início do árduo caminho daqueles que pretendem conseguir a mais importante qualificação no mundo do vinho, o de Master of Wine, concedido pelo Institute of Master of Wine, do Reino Unido.

Ser um Master of Wine (ou seja, carregar aquele imponente MW na frente de sua assinatura) significa que o seu conhecimento no mundo do vinho é absolutamente inquestionável. Para chegar até lá muitas pessoas começam obtendo o diploma do Wine & Spirit Education Trust (WSET). Esse curso (para o qual ser formado em enologia não é pré-requisito) é feito em partes, sendo que a primeira (em português) e a segunda (em espanhol) são oferecidas no Brasil ao menos uma vez por ano. Não são baratos (para o primeiro nível são US$ 400, para o segundo, US$ 850, e, para o terceiro [avançado], US$ 1.600), mas são informativos e importantes.

A próxima fase (obter o diploma propriamente) é feita na Europa e favorece (embora não garanta) o ingresso do diplomado no curso de Master of Wine, pois os postulantes precisam ser previamente indicados por algum MW ou algum importante membro da indústria do vinho, e depois ele ainda será avaliado por um júri. É necessário, além do diploma da WSET ou outro do mesmo nível, ainda ter cinco anos de experiência profissional na área.

 

Se aceito, o candidato começa um programa de estudos voluntário guiado por um mentor, que dura, no mínimo, três anos. O programa anual custa US$ 2.700 sem contar as viagens para os seminários obrigatórios (apenas um por ano letivo), que duram uma semana, e todas as outras despesas com livros, viagens e o que mais for necessário para dominar todas as vertentes do mundo do vinho.

A base de conhecimento para se tornar um MW é muito ampla, por isso o estudo toma tempo e dinheiro. Para citar apenas um exemplo, o brasileiro Dirceu Vianna Jr, único MW do País – graduado em 2008 -, passou sete anos estudando desde que foi aceito no programa até se tornar um Master of Wine. Para ganhar esse título (que somente 279 pessoas no mundo todo possuem), os candidatos precisam entender da produção, comercialização e educação do vinho de maneira extremamente profunda.

O exame é divido em três partes. A prática contem três formulários (com 2h15 de duração) com avaliações às cegas de 12 vinhos cada. Aqui é preciso identificar a variedade, a origem, o produtor, a qualidade e o estilo de cada fermentado. A teórica são quatro provas de três horas de duração que tratam dos conhecimentos de viticultura, enologia, negócios e assuntos gerais e contemporâneos relacionados ao vinho. A última parte, uma dissertação de 10 mil palavras deve ser um estudo original de algum tópico da indústria do vinho que o candidato escolher.